sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Quinze pras nove

Texto de Tati Bernardi.
(Mas poderia ser meu):


Desisti. E isso é a coisa mais triste que tenho a dizer. A coisa mais triste que já me aconteceu. Eu simplesmente desisti.
Não brigo mais com a vida, não quero entender nada. Eu espero chegar as nove da noite pra tomar meu Rivotril. E desaparecer.
Vou nos lugares, vejo a opinião de todo mundo, coisas que acho deprê, outras que quero somar, mas as deixo lá. Deixo tudo lá. Não mexo em nada. Não quero. Odeio as frases em inglês mas o tempo todo penso “I don’t care”. Caguei. Foda-se. Eu espero chegar as nove da noite pra tomar meu Rivotril e desaparecer.
Me nego a brigar. Pra quê? Passei uma vida sendo a irritadinha, a que queria tudo do seu jeito. Amor só é amor se for assim. Sotaque tem que ser assim. Comer tem que ser assim. Dirigir, trabalhar, dormir, respirar. E eu seguia brigando. Querendo o mundo do meu jeito. Na minha hora. Querendo consertar a fome do mundo e o restaurante brega. Algo entre uma santa e uma pilantra. Desde que no controle e irritada. Agora, não quero mais nada. De verdade.
Ah, o roteiro não ficou bom? Então não me pague. Não vejo as mulheres mais bonitas em volta e corro pra malhar. Não quero malhar. Não vejo o que é feio e o que é bonito. É tudo a mesma merda. Não ligo se a faca tirar uma lasca do meu dedo na hora de cortar a maça. Não ligo pra dor. Pro sangue. Pro desfecho da novela. Se o trânsito parou, não buzino. Se o brinco foi pelo ralo, foda-se. Deixa assim. A vida é assim. Não brigo mais. Eu só espero chegar as nove da noite pra tomar meu Rivotril e desaparecer.
Não quero arrumar, tentar, me vingar, não quero segunda chance, não quero ganhar, não quero vencer, não quero a última palavra, a explicação, a mudança, a luta, o jeito. Eu quero, de verdade, do fundo do meu coração, que chegue logo as nove da noite. Hora do Rivotril. O remédio que me chapa. Eu quero chapar. Eu quero não sentir. Quero ver a vida em volta, sem sentir nada. Quero ter uma emoção paralítica. Só rir de leve e superficialmente. Do que tiver muita graça. E talvez escorrer uma lágrima para o que for insuportável. Mas tudo meio que por osmose. Nada pessoal. Algo tipo fantoche, alguém que enfie a mão por dentro de mim, vez ou outra, e me cause um movimento qualquer. Quero não sentir mais porra nenhuma. Só não sou uma suicida em potencial porque ser fria me causa alguma curiosidade. O mundo me viu descabelar, agora vai me ver dormir e cagar pra ele.
Eu quis tanto ser feliz. Tanto. Chegava a ser arrogante. O trator da felicidade. Atropelei o mundo e eu mesma. Tanta coisa dentro do peito. Tanta vida. Tanta coisa que só afugenta a tudo e a todos. Ninguém dá conta do saco sem fundo de quem devora o mundo e ainda assim não basta. Ninguém dá conta e...quer saber? Nem eu. Chega.
Não quero mais ser feliz. Nem triste. Nem nada. Eu quis muito mandar na vida. Agora, nem chego a ser mandada por ela. Eu simplesmente me recuso a repassar a história, seja ela qual for, pela milésima vez. Deixa a vida ser como é. Desde que eu continue dormindo.
Eu só espero chegar as nove da noite pra tomar meu Rivotril e desaparecer. Ser invisível, meu grande pavor, ganhou finalmente uma grande desimportância. Quase um alivio. I don’t care.








terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Muda

Eu sentei na calçada e pedi pra ele falar baixo. Um monte de gente passava olhando pra nós com olhar de reprovação.Do tipo, vocês são jovens,cheios de vida, namorar é a melhor coisa da vida. Parem de brigar. Tenho vontade de chutar o balde quando alguém me olha assim. Eu poderia muito bem ter ido pra casa e dito "boa noite, quando chegar em casa me liga,tá?". Mas definitivamente eu não sou normal e nem sei o que é namorar e aproveitar a vida então. Se namorar e aproveitar a vida for ter que engolir tudo goela abaixo e dar sempre um sorrisinho meio boca em fotos de casais pra colocar no orkut, tô fora. Prefiro ser a doida desequilibrada coitadinha que não dá certo com ninguém. Quem inventou que a gente tem que perdoar, aceitar as pessoas como elas são e sorrir sempre? No mínimo foi uma pessoa muito infeliz. Quer dizer que eu tenho que aceitar olhares intencionados pra outras mulheres, o peito siliconado da minha professora, a mudança repentina de humor ( e caráter?) e a falta de intensidade? No fundo eu gosto das pessoas porque elas são erradas. Qual é a graça de ter alguém que te acorda com flores, te busca no trabalho e te liga pra dar boa noite?Eu prefiro a missão de mudar alguém a ter alguém que não precise de mudança, porque assim quem vai mudar sou e eu não quero mudar. Eu sei ser legal, calma, inteligente, submissa e interagir com os amigos e AMIGAS dos meus namorados. Sei não ser ciumenta, egoísta e maluca no meio da rua. Mas todas as vezes que eu fui assim tive uma vidinha mais ou menos, um relacionamentozinho mais ou menos e um amorzinho mais ou menos. O mais engraçado é que a única vez que eu mudei levei um pé na bunda. Prefiro ser lembrada com saudade do que viver sendo esquecida aos poucos.